quarta-feira, 16 de abril de 2014

Edgar - O rapper que atira poesia

Edgar não é apenas um MC, é um poeta de rua, que não precisa de palco ou evento para disparar seus versos

Há quase um mês o cantor Criolo lançou o videoclipe curta metragem futurista das músicas "Duas de Cinco" e "Cóccix-ência" (trocadalho do carilho, eu diria). O trabalho, produzido pela Paranoid, ficou simplesmente incrível. Destaque para a fotografia e os efeitos especiais. Porém, as letras não são do tipo que me atraem. Palavras como pistola, terror, morte, desgraça, crack e cocaína ou sangue e ladrão me fazem pesar o espírito. Embora, caiba a mim ressaltar que nessas cançõe Criolo faz citações honeráveis, como ao filósofo Focault (conhecido por suas críticas às instituições sociais) e ao historiador marxista Hobsbawn, sem contar com os versos de efeito reflexão, como em Cóccix-ência:

"E a cada mil metros alguém morre de frio
E a cada cem metros alguém morre ferido
E a cada dez metros alguém conta o lixo
E a cada segundo uma revolta por tudo isso"

Você deve estar se perguntando porque abro este texto falando de Criolo se vou falar de Edgar Pereira. Obviamente é pelo rap. Mas, não é só isso. Na semana passada, assisti ao clipe da música Estrela Morta, de Edgar, lançado na quinta-feira (10). Fiquei boquiaberta com a qualidade do trabalho. Me deu uma satisfação, ver algo tão bem feito por quem admiro tanto, por quem tem um potencial enorme. Quem é ele? O cara que me fez parar para ouvir rap, sem estar em uma fase adolescente fingindo fazer parte da realidade da comunidade morando em um sobrado no Maia (bairro nobre de Guarulhos).

Seu sorriso não disfarça sua juventude,
mas esconde um espírito velho, vivido,
que pode ser visto em suas canções

Eu o conheci na primeira apresentação que fiz com minha banda (Luneta Vinil) em um sarau, o Cora Coralina, promovido pelo cursinho preparatório de mesmo nome. Enquanto guardava algo na mochila ele pôs a mão sobre um de meus ombros e disse que havia gostado muito do som, sem nem se apresentar. Quando perguntei seu nome, me dei conta com quem estava falando, era o Edgar, o rapper que tocava no PC lá de casa enquanto um de meus irmãos e seu amigo Rafa cantavam as letras empolgadamente e tomavam uma breja. Associei-o na hora, porque uma de suas músicas havia chamado minha atenção, a qual não recordo o nome agora. Mas, lembro claramente que a poesia de seus versos inteligentes desconstruía o desconforto que me causavam (e causam) algumas letras de rap, aquela sensação de angústia. Cheguei a dizer isso a ele, aquele dia, que o estilo musical não me atraia, mas que ele era a exceção. Inclusive, sua voz e estilo de cantar eram muito peculiares.

As letras de Edgar íam e vão muito mais além do que drogas, violência e pobreza pregadas por muitos rappers ou MC´s por aí. Não que em suas letras esses temas não sejam lembrados ou discutidos, mas, há poucas gírias, propriedade no que é dito e misturas de letras em português e inglês como em "Love (Made in USA)e em "Throw Up (Hip Hop)" e até uma em espanhol, "Agave Azul", que contém citações do filme "El Gran Discuro", dirigido e atuado por Charlie Chaplin. Os beats não são lineares, misturam trechos de outras músicas como em "Ainda Tenho a Morte Inteira Pela Frente", que toma emprestado o início da música "Caro Mozart", de Sylvie Vartan (1975), que também tomou a melodia emprestada de Mozart, da  "Sinfonia n° 40 k550"

Nas canções de Edgar há um universo inteiro. E em pleno clima de Copa ou não, ele dispara versos como esses, em Estrela Morta:

"Fale-me o que lhe impede a não determinar as suas propriedades?
Eu vivo na república das chuteiras
Eu não mastigo grama e nem moro em um estádio
E o futebol aqui distrai mas não melhora a situação (não, não, não)
Barriga brasileira e africana é resistência igual a canela de skatista"


Edgar é para mim o que Criolo já é para muitos, um cara f@d#, genial. A diferença, é que ele deve ter gasto muito pouco ou quase nada para fazer seu clipe, enquanto o curta de Criolo deve ter custado uma fortuna. E, na minha opinião, Estrela Morta não deixa nada a desejar, é muito melhor. (Pronto, fãs de Criolo já podem torcer o nariz). E... Edgar, nós notamos sim essa sua alma camuflada de estrela. Mas, você não é a do tipo que pisca, tem luz forte, contínua. 
Que sua arte permaneça.

Para saber mais sobre este artista, acesse:
facebook.com/OficialEdgar

sexta-feira, 4 de abril de 2014

O QUE ESPERAR DO LOLLAPALOOZA?

Os caras do Soundgarden olhando torto para quem acha que só colará hipster em Interlagos

O festival predileto de hipsters e metidos a moderninhos está prestes a começar. Sim, o Lollapalooza começa amanhã (5) e irá até domingo (6) no Autódromo de Interlagos, onde Galvão Bueno, AQUELE, sempre diz que a chuva vem da represa. É verdade que parte do line-up tocaria na rede Sesc se fosse do Brasil [WARNING: sem demérito], mas algumas atrações são dignas de nota ou de corneta. Isso sem contar os headliners e a promessa de lamaçal maior do que o de 2013, é claro. Vamos lá?

* O Muse, que cancelou o show pré-Lollapalooza de ontem por motivos de doença [hmmm...], tende a fazer o de sempre: muito barulho, riffs e distorções com o selo Matt Bellamy de virtuosismo e terá momentos em que lembrará uma ópera rock. O que, sejamos francos, é bom, ainda mais ao pensar que eles não ficarão presos ao The 2nd Law, último álbum de estúdio. Por outro lado, como eles vêm direto e reto ao Brasil, não estranhe nada se Bellamy subir ao palco com uma camiseta do Iron Maiden e gritar: "Scream for me, Sao Paulo!";

* O Portugal. The Man com certeza entrará na cota underrated do festival. Como apenas duas pessoas com desvio de caráter já ouviram o som da banda nova iorquina [ora pois!], a maioria dos metidos a hipsters não dará muita bola para os herdeiros de pesos-pesados como LCD Soundsystem. E, para ninguém perder o costume, essa será a banda mais desconhecida a ser comentada pelos próximos dias;

* O Imagine Dragons poderá ser uma das decepções. "Por que diz isso, mané?", alguém me perguntará. Vamos lá: quem conhece algo além do hit Radioactive? O público irá à loucura, cantará junto e alguém tentará um mosh leite com pera, mas a mesma vibe dificilmente será a mesma durante o resto do show;

* A Nação Zumbi entrou na cota de monstros sagrados da cena nacional. De tão fodões, dá até constrangimento pensar em falar mal de Jorge du Peixe, Lúcio Maia e cia. limitada. Vá lá, hits da fase Chico Science serão inevitáveis e obrigatórios, mas aguarde doses cavalares do novo trampo, lançado neste ano e que carrega o nome da banda. Ah, e não será só o maracatu que pesará uma tonelada, mas as guitarras de Maia e a empolgação do público estarão no mesmo patamar;

* Jake Bugg é o mais novo queridinho dos descolados e das gurias que se cansaram de boy bands. Vá lá, o mais novo expoente do blasé hipster manda bem, mesmo, e o álbum Shangri La flui bem. Mesmo assim, a galera cantará em uníssono o hit Seen It All, que virou tema de uma novela aí. E não seria de tudo estranho se algumas calcinhas forem jogadas no palco e ele tentar arranhar Fogo e Paixão, do eterno Wando;

* O Phoenix e o Vampire Weekend com certeza farão shows animados, é verdade, mas as chances de ambos os grupos serem representantes da cota "açúcar indie" [projeto Estadão]. Pelo lado do Phoenix, o line-up será predominantemente do álbum Wolfgang Amadeus, que é animado, pero cheio de sintetizadores. Já o Vampire Weekend será lembrado pela eternidade por causa do álbum Contra;

* Tudo o que poderá ser dito sobre o New Order é: assistir ao show é obrigatório. Ir ao Lollapalooza e não ver os ex-integrantes do Joy Division em ação é como ir a Paris e não visitar a Torre Eiffel, ir ao Egito e não ver as pirâmides, vir a São Paulo e não fazer um rolê na Augusta e assim por diante;

* Trent Reznor é jedi faixa-preta, mas não é lá muito provável que o NIN irá empolgar o público. A bad vibe do som da banda tende a falar mais alto [NOTA DO CAGARREGRA: espero estar errado];

* Para quem assistir ao show de Julian Casablancas + The Voidz, uma dica fundamental: desapegue do The Strokes, em especial se você for um fã chato [presente!] que não curtiu Angles e Comedown Machine. O som é pesado, o baixo manda lembranças e as guitarras estão ali, mas há sintetizadores. Como essa é a proposta do som, OK. E, apesar dos pesares, Casablancas é Casablancas;

* O Arcade Fire sempre empolga, não dá para negar, mesmo quando o som não é agitado. O show será predominante do álbum The Reflektor, isso é um fato, mas dá para espera hits do aclamado The Suburs, de 2010;

* Lorde está na cota queridinha do mainstream, por mais que ela não queira. A neozelandesa ainda adolescente, mas cheia de personalidade e marra, mostrou que não veio ao show bizz a passeio e quer provar por A+B que não é apenas um produto da indústria fonográfica. Tanto que lendas como Bruce Springsteen já tocaram o seu hit, Royals, ao vivo. Ah, vejamos se ela não terá nenhum momento à Caetano Veloso, dará algum piti e mandará alguém botar essa p*rr@ para funcionar;

* O Pixies entra na cota de memória afetiva e vem sem a baixista Kim Deal [esqueçam: ela não voltará à banda]. Tentando mostrar ao público brasileiro que o som não se resume a Here Comes Your Man e Where's My Mind?, o hino mundial da ressaca, os caras lançaram o álbum EP-1 após hiato de 23 (!!!) anos. Será que empolga?;

* Landies and gentlemen, não dá para negar que a grande atração do Lollapalooza é, sim, o Soundgarden. A trupe liderada por Chris Cornell estará eternamente dentro dos corações dos grunges dos anos 90, que irão ao Autódromo de Interlagos no domingo (6) apenas por eles - com alguma sorte, pelo Pixies também. O último álbum dos caras, o bom King Animal, será predominante no set list, mas a galera irá à loucura com sonzeiras do nível de Rusty Cage e Black Hole Sun.

Enfim, a seção de cagação de regra acaba por aqui. Podem ignorar tudo o que foi dito acima e curtir o Lollapalooza sem preconceitos, mas sem achar tudo lindo e maravilhoso.